Para que seja caracterizado o trabalho doméstico, é necessário que a atividade exercida não tenha fins lucrativos e que os serviços sejam prestados de forma contínua à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas. Essa é a regra estabelecida pelo artigo 1º da Lei 5.859/72, no qual o juiz Antônio Neves de Freitas se baseou para fundamentar sua sentença. O magistrado, que é titular da 2ª Vara do Trabalho de Congonhas, afastou a natureza doméstica da prestação de serviços da reclamante, já que ficou comprovado no processo que a trabalhadora atuava como diarista, executando todas as tarefas domésticas e, ao mesmo tempo, como empregada de umbuffet que funciona na residência da empregadora.
Em seu depoimento, a própria reclamada declarou que a empregada, além de fazer o trabalho doméstico, também lavava os materiais do buffet de sua propriedade. Segundo as alegações da reclamante, além do salário contratual, ela recebia “por fora” a quantia de R$ 50,00 por sábado trabalhado, quando participava de festas promovidas pelo buffet, o que ocorria, em média, duas vezes por mês. Acrescentou a trabalhadora que prestou serviços nessas condições por quase um ano, sem anotação da sua carteira de trabalho. Apesar das tentativas da empresária de convencer o magistrado de que o trabalho realizado aos sábados era eventual, a prova oral, incluindo declarações da própria reclamada, demonstrou o contrário. Nesse sentido, ficou comprovado, através dos depoimentos prestados, que a reclamante participava de uma festa por mês, no período de janeiro a agosto de cada ano, e de duas festas mensais a partir de setembro, quando havia “maior aperto”, sendo que a jornada de trabalho costumava ser de 13:30 até 1:30 da manhã, nessas ocasiões.
Após análise minuciosa dos fatos e das provas, o juiz constatou que a reclamante não se enquadra na definição de empregado doméstico, descrita no artigo 1º da Lei 5.859/72. Ou seja, como houve uma mistura desordenada de trabalho em benefício da entidade familiar, sem fins lucrativos, com serviço voltado para atividade empresarial, este último deve prevalecer, descaracterizando o vínculo doméstico. Portanto, o magistrado considerou que a reclamante é empregada urbana, cujo trabalho é disciplinado pela CLT.
“No entendimento desse Juízo, a promiscuidade na prestação de labor, conjugando o trabalho doméstico com serviços destinados ao empreendimento comercial da reclamada, descaracteriza a natureza doméstica das atividades da reclamante, afastando a incidência do art. 1° da Lei 5.859/72 e atraindo a aplicação da CLT” – finalizou o juiz sentenciante, condenando a dona do buffet a retificar a CTPS da reclamante, inclusive quanto à remuneração mensal, com o devido pagamento das verbas rescisórias, incluindo as diferenças decorrentes da incidência dos valores pagos “extra-folha” à trabalhadora.
( nº 00263-2010-088-03-00-1 )